segunda-feira, dezembro 12, 2005

Esta história do Mourinho já começa a parecer amor...

"5 reflexões sobre uma visita a Angola"
Nicolau Santos
Expresso - 10/12/2005
"A RECENTE visita a Angola do ministro dos Negócios Estrangeiros, Freitas do Amaral, permite retirar um conjunto de ilações e ensinamentos, sobre os quais vale a pena meditar, com o objectivo de Portugal consolidar uma parceria estratégica com o grande país africano irmão.
1 Há cinco razões que explicam que Angola esteja a viver um período completamente diferente daquele que atravessou até 2002. A primeira é a paz, irreversível, que permite que todas as energias se concentrem agora na reconstrução do país. A segunda é a abertura política, que se traduz não só na existência de oposição e de um parlamento multipartidário, mas sobretudo numa imprensa independente, ainda frágil, mas que critica sem reservas o poder e denuncia
decisões e actos errados ou obscuros. Em terceiro, essa liberdade de opinião estende-se já a vários sectores, nomeadamente o universitário, onde vi e ouvi os estudantes colocarem questões, muito aplaudidas, a Freitas do Amaral, na presença de importantes membros do Governo angolano, que não passaria pela cabeça de ninguém fazer há cinco anos - por exemplo, como é possível Angola afirmar-se como potência regional com dirigentes que se eternizam no poder, com grandes desigualdades sociais e com elevados índices de corrupção. Em quarto, o elevado preço do petróleo tem permitido a Angola saldar os contenciosos financeiros com diversos países, entre os quais Portugal, condição necessária para encetar uma nova fase nas relações comerciais e de investimento com esses parceiros; e quinto, a enorme linha de crédito aberta pela China, no valor de dois mil milhões de dólares, vai permitir a recuperação, num prazo de três a cinco anos, de grande parte das infra-estruturas ferroviárias e rodoviárias, tornando utilizáveis os canais de distribuição e abastecimento às populações por todo o país, que, como se sabe, é 14,5 vezes maior que Portugal.
2 Neste quadro, esta visita marca efectivamente o início de uma nova etapa no relacionamento entre os dois países, não só pelo pragmatismo de que o ministro deu provas, garantindo a resolução de casos concretos emperrados há anos pela burocracia, como pela empatia que foi visível com o MNE angolano, João Miranda, como pelo prestígio que desfruta em Angola, já que os estudantes de Direito se orientam pelos seus livros.
3 É um novo quadro que deverá ficar sedimentado aquando da visita a Angola do primeiro-ministro, José Sócrates, na segunda quinzena de Março. E na verdade, a entrada em funcionamento das novas instalações da Escola Portuguesa em Luanda no próximo ano lectivo, com capacidade imediata para 1200 alunos, mas que chegará aos 2000; a criação do grande Hospital Português de Luanda; o apoio do ICEP à criação de plataformas logísticas comerciais, nomeadamente de mercados abastecedores e de redes de armazenamento, frio e distribuição de produtos alimentares; o aumento substancial, dos actuais 100 milhões para mais do dobro, da linha de crédito que garante as exportações portuguesas para aquele mercado; a decisão de tornar o consulado de Luanda como o modelo do que será a nova rede consular portuguesa, tudo isto demonstra pragmatismo, vontade de resolver problemas, apoiar naquilo em que obviamente temos vantagens em relação a chineses, espanhóis ou brasileiros - e cria certamente as condições para um novo relacionamento luso-angolano, na base da igualdade e respeito mútuo.
4 É claro que há arestas a limar. O programa do ensino secundário da Escola Portuguesa de Luanda, idêntico ao ministrado em Portugal, tem de ser adaptado à realidade local e incluir uma cadeira de história e geografia de Angola. O novo hospital tem de ser bem negociado entre o Estado português e os privados, para que depois do anúncio da iniciativa ela acabe mesmo por se concretizar. E o Banco de Portugal pode certamente olhar para o mercado angolano, que está em rápida mutação, e melhorar a sua apreciação, que o coloca no patamar do «risco máximo», obrigando os bancos nacionais a provisionar 25% dos créditos que concedem às exportações para Angola.
5 A visita de Sócrates a Luanda não só pode resolver todas estas pequenas questões ainda pendentes, como lançar outras pontes para o futuro. A realização de uma grande conferência de investidores portugueses nessa altura será certamente um marco. É importante que todos os grandes grupos nacionais estejam presentes, inclusive Belmiro de Azevedo, o único grande empresário português sem investimentos em Angola. E que bom seria se fosse possível dar uma enorme alegria aos angolanos não só levando àquele país os nosso melhores escritores, artistas de teatro, cantores e grupos musicais, como os nossos ídolos do desporto, que lá são tão ou mais incensados do que cá: Cristiano Ronaldo e José Mourinho. Tornaria a visita verdadeiramente inesquecível. Será pedir muito?"