quarta-feira, abril 26, 2006

E é pena...

"O dinheiro não cai do céu, meus senhores!"
Nicolau Santos
Expresso - 22/04/2006
«OS MAIS recentes dados sobre a execução orçamental são muito preocupantes e permitem concluir 1) que vai ser dificilimo cumprir o Orçamento do Estado para 2006; 2) que este Governo também não conseguiu controlar a despesa, que cresceu acima do que estava previsto no Orçamento Rectificativo de 2005.

É verdade que o OE do ano passado foi elaborado por um Governo do PSD e pelo ministro Bagão Félix - e era uma completa ficção. O OE Rectificativo, da responsabilidade do PS, tentou evitar o descalabro total. Mas o facto é que o saldo orçamental em percentagem do PIB, o saldo orçamental excluindo medidas temporárias, o saldo orçamental primário e o saldo primário ajustado do ciclo pioraram todos em 2005 quando comparados com os três anos anteriores.

O mais grave é que isto acontece num período em que os portugueses pagam cada vez mais impostos, fazendo com que a receita do Estado tenha atingido 41,9% do PIB no ano passado, contra 40,4% em 2003 e 41% em 2004.

Em contrapartida, o Estado não faz dieta. Na verdade, a despesa pública segue sem freio: 45,7% do PIB em 2003, 46,3% em 2004 e 47,9% em 2005. A despesa corrente primária, enfunada pelo crescimento automático das transferências sociais, aumentou quase 7% no ano passado, o que, mais que inadmissível, é insustentável, sobretudo quando o PIB estagnou. E, como consequência, a dívida pública passou de 58,6% para 64%, outro sinal inquietante.

Poderia haver uma esperança - a garantia de que, daqui para a frente, tudo vai ser diferente. Mas a OCDE afirma que são necessárias medidas adicionais e o Banco de Portugal lança dúvidas sobre o cumprimento das promessas do Governo. Por um lado, sublinha que o essencial do esforço de consolidação este ano estará ainda concentrado do lado da receita, que suportará cerca de dois terços do ajustamento previsto. Por outro, duvida de um conjunto de medidas anunciadas (a regra da saída de dois funcionários para entrar apenas um, o não aumento dos pagamentos sociais) e lembra que outras (reforma da administração central e revisão do sistema contributivo da função pública) só terão efeitos em 2007.

Estamos, pois, a entrar numa fase em que não bastam só discursos corajosos, é preciso começar a ver resultados. Ora o forte crescimento da despesa corrente primária no ano passado deixa inquietos todos os que consideram que os socialistas só sabem governar atirando dinheiro para os problemas - porque pensam que ele cai do céu.

2006 é, pois, um ano decisivo para a credibilidade deste Governo. Não há conjuntura externa, por pior que seja - e é, com o petróleo a caminho dos 80 dólares e o aumento das taxas de juro -, que justifique que o Estado continue a engordar, enquanto os portugueses apertam o cinto. E ninguém aceitará que o desequilíbrio orçamental venha de novo a ser resolvido à custa do aumento dos impostos - porque o problema não é cobrar mais, é gastar menos ou, por outras palavras, é inviável sustentar este modelo de funcionamento.»